29 maio, 2013

Para Quem Quer Aprender a Gostar

"Se o amor existe, seu conteúdo já é manifesto. Não se preocupe mais com ele e suas definições. Cuide agora da forma. Cuide da voz. Cuide da fala. Cuide do cuidado. Cuide do carinho. Cuide de você. Ame-se o suficiente para ser capaz de gostar do amor e só assim poder começar a tentar fazer o outro feliz."

Artur da Távola

30 janeiro, 2013

Sobre o desejo absoluto das partes do todo

    Perguntaram-me se eu apenas consigo desejar coisas completas. Respondi que sim. Alguém, por favor, me ajude a entender como é que se deseja algo pela metade. Eu fiquei pensando como seria ter em mãos seu picolé favorito mas desejar apenas a metade dele e descartar a outra metade que seria menos desejável. Como é querer o beijo de quem se ama e não atrelar isso ao abraço, ou vice e versa? Como é, sendo religioso, crer na metade da bíblia e desprezar a outra metade? Igual seria eu abrir um clássico literário extremamente instigante e ler apenas a metade dele pois, mesmo sendo instigante, é proibido desejar  ler a outra metade do livro. Qual lógica movimenta isso?
    Talvez seja a lógica invisível por trás de tudo, essa que nos motiva a fazer todas as coisas pela metade: professores fingem que ensinam, enquanto os alunos fingem que aprendem; pastores fingem santidade, enquanto féis fingem que são santos; namorados fingem que amam, enquanto as namoradas fingem que são amadas, ou vice e versa. E assim caminha a humanidade. Nos acostumamos a ter tudo pela metade, quando temos. Metade da qualidade na educação, na saúde e na segurança pública, mesmo pagando o dobro equivalente. Apoiamos o candidato que é metade bom e metade mal, que rouba mas faz. Pagamos caríssimo por bens que custam a metade do preço em outros países, mas aqui são produtos "meia boca". Tudo ao meio, metade disso e metade daquilo. 
    E se a gente partisse do pressuposto que os "inteiros" são mais interessantes? Assim,  amar por inteiro abrangeria realmente os quesitos matrimoniais "na saúde e na doença, na alegria e na tristeza, na riqueza e na pobreza". Talvez assim as pessoas se suportassem em amor nos momentos favoráveis e desfavoráveis.  
    Ao falar sobre "o desejo absoluto das partes do todo" tenho o intuito de dizer que, obviamente, nem sempre podemos ter o todo, pois isso é muita coisa. Mesmo que eu jamais consiga desvendar todos os mistérios do mundo, desfrutar de todos os oceanos ou conhecer todos os países do planeta, a parte que me toca conhecer será meu todo e daquilo viverei sem meios termos. Parece-me uma questão um tanto filosófica que  as palavras que me chegam não alcançam explicar. Mas, ao fim e ao cabo, quero dizer que não vejo inconvenientes em apostar todas as fichas naquilo que acreditamos. Ainda que não vingue, você já terá desfrutado como pode e ainda terá mais fichas para gastar com outras apostas. Pois nesse jogo que se chama vida, todos os dias é dia de encher os bolsos de possibilidades e vivê-las desejosa e absolutamente. 
    Longe de querer parecer hedonista, egoísta ou ambiciosa, longe mesmo. É que as vezes me pego  pensando nessas questões tão minhas. As vezes abro mão  de coisas que me pareciam extremamente importantes por acreditar que a missão foi cumprida e por acreditar que cada coisa tem seu  tempo certo para acontecer. E é no tempo de cada coisa que quero me debruçar, me gastar e investir tempo e espírito.      Meu desejo maior é que cada ciclo de vida seja desfrutado avidamente e que a grandeza de cada detalhe supra minha necessidade de infinitude, mesmo sabendo-me finita.
     Bom, esse é mais um texto para o qual não tenho um final. Como sempre, meu problema com términos e delimitações abrange também a escrita. E assim digo...fim.


17 junho, 2012

Quem ouve música sente sua solidão imediatamente povoada.

[Robert Brownig]
As leis não bastam. Os lírios não nascem da lei.

[Drummond]
Morre lentamente quem não vira a mesa quando está infeliz com o seu trabalho, quem não arrisca o certo pelo incerto para ir atrás de um sonho, quem não se permite, pelos menos uma vez na vida, fugir dos conselhos sensatos.

[Pablo Neruda]
Poderia dizer que a vida é bela, e muito,
e que a revolução caminha com pés de flor
... mas não. O poeta mente.
A vida
nós amassamos em sangue e samba
enquanto gira inteira a noite
sobre a pátria desigual.

[Ferreira Gullar]
Em que idioma cai a chuva
sobre cidades dolorosas?
Que suaves sílabas repete
o ar da alvorada marinha?

[Pablo Neruda]

Quem sou eu

É necessário agora que eu diga que espécie de homem sou. Meu nome, não importa, nem qualquer outro pormenor exterior meu próprio. Devo falar de meu caráter. A constituição inteira de meu espírito é de hesitação e de dúvida. Nada é ou pode ser positivo para mim; todas as coisas oscilam em torno de mim, e, com elas, uma incerteza para comigo mesmo. Tudo para mim é incoerência e mudança. Tudo é mistério e tudo está cheio de significado. Todas as coisas são 'desconhecidas', simbólicas do Desconhecido. Em conseqüência, o horror, o mistério, o medo por demais inteligente. Pelas minhas próprias tendências naturais, pelo ambiente que me cercou a infância, pela influência dos estudos realizados sob o impulso delas (dessas mesmas tendências), por tudo isto meu caráter é da espécie interiorizada, concentrada, muda, não auto-suficiente, mas perdida em si mesma. Toda a minha vida tem sido de passividade e de sonho". Fernando Pessoa (1888-1935)