28 fevereiro, 2011

Uma palavrinha sobre palavras



Um dia alguém chega a você gastando saliva, tempo e intensidade com palavras que poderiam ficar guardadas para si mesmo. Melhor ainda se não fossem nem guardadas pois tornam pesado o que poderia ser tão leve. Não sei o que pensar dessas pessoas, mas tenho uma tímida impressão que elas são muito infelizes. Não culpo ninguém por suas infelicidades, que fique dito, eu apenas lastimo de mãos atadas. Dores são muito particulares. Acontece que se você tem um coração desses bobos, desses que existem para sentir, sentir e sentir , você realmente sente. Daí, quando esse alguém vê de gastar saliva com esse povo de coração bobo as coisas ficam, digamos, complicadas. Sabe aquela palavrinha que não precisava ser escutada, desnecessária aos sentidos e à vida? Pois é, elas entram como faca em suas entranhas causando uma dorzinha que faz tremer sua existência. Não sei. Pode ser um “não te amo, não sei se te amo, te amo mas não te amo”. Há de outras ordens: “feia, chata, magricela”. E tem: “eu vou embora, ele(a) morreu, você está gravemente enfermo”. Algumas penetram mais que outras, porém todas insinuam saber exatamente o ponto certo onde tomar assento.

É. Palavras mal(ditas) agridem muito, mesmo essas ditas em um momento de pouca cautela e razão. Se nós pudéssemos mensurar a imensidão do peso de cada uma de nossas sentenças, acredito que falaríamos menos ou melhor. Quando elas são proferidas por pessoas amadas ou amantes essa imensidão deverá ser multiplicada pelo infinito, elevada à grandiosa potencia. Pior que as (mal) ditas são as benditas que não foram ditas. Desculpem o trocadilho, espero que me tenha feito entender.

Se eu pudesse acrescentar uma bem aventurança seria essa: Bem aventurados os que guardam as mágoas para si. Melhor, bem aventurados os que se desfazem de seus fantasmas. Ou, felizes os que sabem lidar com suas dores. Assim, menos dor resultaria em menos erupção verbal nociva à existência. Se eu pudesse decretar um AMÉM, seria: Que todos se acariciem com palavras. Se eu pudesse prestar um serviço: Esvaziamos sua lixeira em poucos segundos. Traga seu coração e o faremos novinho em folha. O meu seria o projeto piloto. Por fim, se a boca fala do que está cheio o coração, conforme já dizia o Sr. Lucas, presumo que há muitos corações empoeirados.


Por Viviane Mattus











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Quem sou eu

É necessário agora que eu diga que espécie de homem sou. Meu nome, não importa, nem qualquer outro pormenor exterior meu próprio. Devo falar de meu caráter. A constituição inteira de meu espírito é de hesitação e de dúvida. Nada é ou pode ser positivo para mim; todas as coisas oscilam em torno de mim, e, com elas, uma incerteza para comigo mesmo. Tudo para mim é incoerência e mudança. Tudo é mistério e tudo está cheio de significado. Todas as coisas são 'desconhecidas', simbólicas do Desconhecido. Em conseqüência, o horror, o mistério, o medo por demais inteligente. Pelas minhas próprias tendências naturais, pelo ambiente que me cercou a infância, pela influência dos estudos realizados sob o impulso delas (dessas mesmas tendências), por tudo isto meu caráter é da espécie interiorizada, concentrada, muda, não auto-suficiente, mas perdida em si mesma. Toda a minha vida tem sido de passividade e de sonho". Fernando Pessoa (1888-1935)