04 maio, 2011

Loucos e Santos




Escolho meus amigos não pela pele ou outro arquétipo qualquer, mas pela pupila.  Tem que ter brilho questionador e tonalidade inquietante.  A mim não interessam os bons de espírito nem os maus de hábitos.  Fico com aqueles que fazem de mim louco e santo.  Deles não quero resposta, quero meu avesso.  Que me tragam dúvidas e angústias e agüentem o que há de pior em mim.  Para isso, só sendo louco. 
Quero os santos, para que não duvidem das diferenças e peçam perdão pelas injustiças.  Escolho meus amigos pela alma lavada e pela cara exposta.  Não quero só o ombro e o colo, quero também sua maior alegria.  Amigo que não ri junto, não sabe sofrer junto. Meus amigos são todos assim: metade bobeira, metade seriedade. 
Não quero risos previsíveis, nem choros piedosos.  Quero amigos sérios, daqueles que fazem da realidade sua fonte de aprendizagem, mas lutam para que a fantasia não desapareça. Não quero amigos adultos nem chatos.  Quero-os metade infância e outra metade velhice!  Crianças, para que não esqueçam o valor do vento no rosto; e velhos, para que nunca tenham pressa. 
Tenho amigos para saber quem eu sou. Pois os vendo loucos e santos, bobos e sérios, crianças e velhos, nunca me esquecerei de que "normalidade" é uma ilusão imbecil e estéril.


Por Oscar Wilde

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Quem sou eu

É necessário agora que eu diga que espécie de homem sou. Meu nome, não importa, nem qualquer outro pormenor exterior meu próprio. Devo falar de meu caráter. A constituição inteira de meu espírito é de hesitação e de dúvida. Nada é ou pode ser positivo para mim; todas as coisas oscilam em torno de mim, e, com elas, uma incerteza para comigo mesmo. Tudo para mim é incoerência e mudança. Tudo é mistério e tudo está cheio de significado. Todas as coisas são 'desconhecidas', simbólicas do Desconhecido. Em conseqüência, o horror, o mistério, o medo por demais inteligente. Pelas minhas próprias tendências naturais, pelo ambiente que me cercou a infância, pela influência dos estudos realizados sob o impulso delas (dessas mesmas tendências), por tudo isto meu caráter é da espécie interiorizada, concentrada, muda, não auto-suficiente, mas perdida em si mesma. Toda a minha vida tem sido de passividade e de sonho". Fernando Pessoa (1888-1935)